Março 2021
Ciência Na Frente
Do Infinitamente Pequeno ao Infinitamente Grande
Março de 2021
Diz-se que o Universo tem 13,8 mil milhões de anos. Este conhecimento não vem, claro está, de uma observação direta. Conseguimos medir a idade de alguns objetos astrofísicos, o que nos fornece um limite inferior sobre a idade do Universo, mas esta última é deduzida a partir do modelo cosmológico no seu conjunto. Esta afirmação recai também sobre um conjunto de hipóteses e observações.
Em primeiro lugar temos de definir o que é esta idade, ou seja, «a duração que decorreu entre a singularidade inicial até hoje, medida por um observador fundamental» (trata-se de uma classe teórica de observadores de referência, definidos pelo princípio coperniciano e em que o tempo considerado é o tempo cósmico, ao qual todo o observador real pode comparar as suas medições). Com efeito, lembremos que na relatividade, a duração decorrida entre dois acontecimentos depende do estado de movimento dos observadores. Trata-se, por isso, de uma idade teórica calculada a partir do modelo que se extrapola até ao Big Bang.
No quadro do modelo do Big Bang, a afirmação recai sobre a validade da relatividade geral para descrever a dinâmica da expansão, para definir o desvio espetral (o redshfit - desvio para o vermelho) e relacioná-lo com o tempo. Também repousa no princípio coperniciano, que opera uma variedade de soluções cosmológicas, levando à definição dos observadores fundamentais e permite a interpretação de todas as observações que reforçam o modelo. Num modelo não homogéneo, por exemplo, a taxa de expansão seria diferente em cada ponto do Universo e a duração entre a singularidade inicial e o observador dependeriam da posição deste último no cosmos. Assim, não haveria uma noção «universal» da idade do Universo e seria necessário precisar qual era o observador.
Para terminar, os modelos são ajustados a partir de um conjunto de dados observacionais, que se utiliza para determinar o melhor valor dos parâmetros cosmológicos. Com todos estes elementos, é então possível calcular a idade do Universo. Acontece a mesma coisa para quase todas as afirmações sobre a cronologia cósmica, como por exemplo quando se diz que o ruído difuso cosmológico foi emitido 380 000 anos após o Big Bang.
Fonte: Pour La Science - março 2021, n.º 521, p. 38
Jean-Philippe Uzan,
cosmólogo do CNRS no Instituto de Astrofísica de Paris (adaptado)
Testar os fundamentos do modelo do Big Bang
Alguns resultados das observações astrofísicas parecem inconciliáveis. Será este o sinal que as hipóteses de base do modelo do Big Bang têm de ser revistas?
Em apenas um século, os astrofísicos construíram um modelo matemático e físico do nosso Universo. Este modelo do Big Bang foi-se impondo progressivamente, porque conseguiu interpretar e conciliar um vasto conjunto de observações e porque oferece uma visão coerente da história cósmica. Entretanto, as questões sobre os primeiros instantes do Universo e sobre a natureza do seu conteúdo material permanecem ainda abertas.
Para lá destes enigmas, observações recentes fizeram aparecer tensões no seio do modelo. Estas tensões têm que ver, por exemplo, com a medição da constante de Hubble, que define a taxa de expansão atual do Universo, ou, desde há alguns meses, com a densidade média da matéria bariónica (a matéria ordinária [comum]). Vários métodos para determinar esse valor, sustentam-se sobre observações muito diferentes, levando, atualmente, a resultados incompatíveis entre eles. Os astrofísicos esforçam-se por compreender estes desacordos. A culpa estará nas observações ou numa errada interpretação dos dados?
Estas tensões emergem num quadro particular, o modelo do Big Bang. Este foi construído progressivamente. Inicialmente muito qualitativo e pouco baseado em observações, evoluiu graças aos avanços teóricos e técnicos. Os investigadores afinaram a sua descrição do Universo e o modelo tornou-se mais quantitativo. Os parâmetros deste modelo são atualmente medidos com uma precisão da ordem de alguns por cento. Fala-se de «cosmologia da precisão» ou de «cosmologia por cento».
Uma outra forma de abordar o problema destas tensões consiste em recordar que todo o modelo, como o do Big Bang, recai num conjunto de hipóteses que é necessário questionar permanentemente. À medida que a precisão das medições aumenta, essas hipóteses, e portanto o próprio modelo, estarão ainda adaptadas para interpretar as observações? Será necessário abandonar algumas delas ou modificá-las? Tem-se vindo a explorar esta via de reflexão. Ao testar as hipóteses do modelo do Big Bang, o objetivo será consolidar e melhorar os fundamentos do modelo cosmológico e eventualmente identificar pistas para resolver as questões em aberto e as tensões que nele ainda persistem.
Um modelo, em cosmologia, mas de modo geral em ciência, é um quadro teórico que dá uma descrição simplificada de um fenómeno. Está condenado a evoluir. Por exemplo, é necessário aceitar que certas questões permanecem para lá do seu campo explicativo num determinado momento. Os primeiros modelos cosmológicos dos anos 1920, fundados na relatividade geral de Albert Einstein, descreviam a matéria como um «gás» de estrelas ou de galáxias no qual bastava conhecer a sua densidade média. Por construção, não estavam adaptados para o estudo da formação das galáxias e da sua evolução. Todavia, conseguiram determinar um grande resultado: longe de ser estatístico, o Universo está em expansão, afirmaram. O russo Alexander Friedmann e o belga Georges Lemaître fizeram a previsão desta dinâmica, que foi seguidamente confirmada em 1929 pelo astrónomo americano Edwin Hubble, ao medir a velocidade de afastamento das galáxias em função da sua distância. Ainda que muito limitada inicialmente, este modelo forneceu o quadro no qual se iria construir a nossa visão atual do Universo.
A maior parte dos testes serão desenvolvidos nos próximos anos e será interessante avaliar a precisão das hipóteses atuais. Com as novas tensões, estes testes talvez forneçam indícios, que poderão servir como um fio de Ariana providencial para levar a uma melhor compreensão da origem da aceleração cósmica e da natureza da matéria negra. Esse fio também servirá para fazer evoluir o modelo do Big Bang ou a modificá-lo, ou ainda, a melhorar o seu domínio de validade, tornando mais confortáveis algumas das suas conclusões. Isto faz parte de um modelo vivo.
Fonte: Pour La Science - março 2021, n.º 521, pp. 34-43
Jean-Philippe Uzan,
cosmólogo do CNRS no Instituto de Astrofísica de Paris (adaptado)
O que posso observar no céu de março?
2 - Lua no perigeu a 365 423 Km da Terra - 05:18
05 - Mercúrio a 0,3ºN de Júpiter - 07:00
09 - Lua a 4ºS de Saturno - 23:00
11 - Lua a 4ºS de Mercúrio - 01:00
18 - Lua no apogeu 405 252 Km da Terra - 06:03
19 - Lua a 1,9ºS de Marte - 19:00
20 - Equinócio vernal. A primavera começa - 09:37
23 - Marte a 7ºN de Aldebarã - 00:00
30 - Lua no perigeu a 360 310 Km da Terra - 06:16
Fases da Lua em março
13 - às 10h 21min - nova
21 - às 14h 40min - crescente
21 - às 14h 40min - crescente
28 - 18h 48min - cheia
06 - às 01h 30min - minguante
Planetas visíveis a olho nu em março
MERCÚRIO - Será visível, de manhã, por volta do instante do começo do crepúsculo civil, a partir de 15 de fevereiro.
VÉNUS - Neste mês não é visível por se encontrar demasiado próximo do Sol.
MARTE - Pode ser visto de manhã, na constelação de Touro, durante todo este mês.
JÚPITER - Pode ser visto ao amanhecer durante todo este mês.
VÉNUS - Neste mês não é visível por se encontrar demasiado próximo do Sol.
MARTE - Pode ser visto de manhã, na constelação de Touro, durante todo este mês.
JÚPITER - Pode ser visto ao amanhecer durante todo este mês.
SATURNO - Pode ser visto ao amanhecer durante todo este mês.
Fonte: Observatório Astronómico de Lisboa
(para localizações aproximadas de 41.1756ºN, 8.5493ºW)
Data | Magnitude | Início | Ponto mais alto | Fim | Tipo da passagem | ||||||
(mag) | Hora | Alt. | Az. | Hora | Alt. | Az. | Hora | Alt. | Az. | ||
28-3 | -1,3 | 21:12:24 | 10° | NNO | 21:14:31 | 15° | N | 21:16:12 | 12° | NE | visível |
28-3 | -0,4 | 22:48:48 | 10° | NO | 22:49:10 | 12° | NO | 22:49:10 | 12° | NO | visível |
29-3 | -1,2 | 20:24:57 | 10° | NNO | 20:26:51 | 14° | N | 20:28:46 | 10° | NE | visível |
29-3 | -1,9 | 22:01:30 | 10° | NO | 22:03:40 | 25° | N | 22:03:40 | 25° | N | visível |
30-3 | -1,9 | 21:14:13 | 10° | NO | 21:16:56 | 22° | NNE | 21:18:10 | 18° | NE | visível |
30-3 | -0,4 | 22:50:41 | 10° | ONO | 22:51:08 | 13° | ONO | 22:51:08 | 13° | ONO | visível |
31-3 | -1,6 | 20:26:55 | 10° | NNO | 20:29:19 | 18° | NNE | 20:31:43 | 10° | ENE | visível |
31-3 | -2,6 | 22:03:17 | 10° | NO | 22:05:40 | 41° | NNO | 22:05:40 | 41° | NNO | visível |
1-4 | -3,0 | 21:15:56 | 10° | NO | 21:19:10 | 41° | NNE | 21:20:14 | 30° | ENE | visível |
1-4 | -0,4 | 22:53:02 | 10° | ONO | 22:53:12 | 11° | O | 22:53:12 | 11° | O | visível |
2-4 | -2,4 | 20:28:38 | 10° | NO | 20:31:38 | 29° | NNE | 20:34:37 | 10° | E | visível |
2-4 | -2,4 | 22:05:19 | 10° | ONO | 22:07:49 | 36° | OSO | 22:07:49 | 36° | OSO | visível |
3-4 | -3,7 | 21:17:48 | 10° | ONO | 21:21:10 | 75° | SO | 21:22:30 | 33° | SE | visível |
4-4 | -3,6 | 20:30:22 | 10° | NO | 20:33:44 | 65° | NE | 20:37:03 | 10° | ESE | visível |
4-4 | -1,2 | 22:08:14 | 10° | O | 22:10:11 | 15° | SO | 22:10:14 | 15° | SO | visível |
5-4 | -1,8 | 21:20:07 | 10° | ONO | 21:22:54 | 24° | SO | 21:25:04 | 14° | S | visível |
6-4 | -2,7 | 20:32:23 | 10° | ONO | 20:35:35 | 42° | SO | 20:38:46 | 10° | SSE | visível |
Como usar esta grelha:
Coluna Data - data da passagem da Estação;
Coluna Brilho/Luminosidade (magnitude) - Luminosidade da Estação (quanto mais negativo for o número maior é o brilho);
Coluna Hora - hora de início, do ponto mais alto e do fim da passagem;
Coluna Altitude - altitude medida em graus tendo o horizonte como ponto de partida 0º;
Coluna Azimute - a direção da Estação tendo o Norte geográfico como ponto de partida.
Coluna Azimute - a direção da Estação tendo o Norte geográfico como ponto de partida.
Fonte: http://www.heavens-above.com/
Vídeo do Mês
As origens do Universo
(Quando necessário, para ativar as legendas automáticas proceder do seguinte modo: no canto inferior direito clicar no símbolo "roda dentada"; abrem-se as Definições; clicar aí e escolher Legendas; depois clicar em Traduzir Automaticamente; finalmente escolher Português na lista.)
(Quando necessário, para ativar as legendas automáticas proceder do seguinte modo: no canto inferior direito clicar no símbolo "roda dentada"; abrem-se as Definições; clicar aí e escolher Legendas; depois clicar em Traduzir Automaticamente; finalmente escolher Português na lista.)
Imagem do Mês
Montadas no planeta Terra, estas 142 imagens independentes formam a panorâmica de 360 graus do terreno da cratera Jezero, em Marte. Estas imagens de alta-resolução, a cores, foram obtidas pela câmara Mastcam-Z do rover Perseverança, durante a missão sol 3. Em primeiro plano vê-se o convés do rover. Largas manchas de cores claras no solo marciano têm que ver com a limpeza originada pelos motores de descida, durante a dramática chegada do rover no passado dia 18 de fevereiro. Vê-se à distância a borda, com 45 quilómetros, da cratera Jezero. Nas próximas missões, a Perseverança irá explorar o antigo sistema em delta do lago que fica na cratera, em busca de sinais de antiga vida microscópica e colecionando amostras para um potencial retorno ao planeta Terra.
Fonte: www.nasa.gov
Fonte: www.nasa.gov
Livro do Mês
A partir deste ano vamos iniciar uma nova secção, a do livro do mês. Aqui serão apresentados livros, preferencialmente, de ensaios científicos, sociais, filosóficos, esperando que motivem os nossos "bloggers" a descobri-los.
Sinopse
"O que nos torna especiais? Como tudo teve origem? Quando começamos a caminhar eretos? Quando aconteceu o milagre da linguagem? Qual é a origem da música, da religião e da lei? Como teve início o comércio e o uso da moeda? Porque nasceram as primeiras cidades? Quando é que começamos a enterrar os nossos mortos? Porque é que a maioria das sociedades valoriza a monogamia?
Neste livro, Jürgen Kaube, um dos especialistas mais reconhecidos na área da divulgação científica, dá resposta a todas estas questões, muitas das quais continuam a estar na origem de disputas culturais, políticas e religiosas. Um relato absolutamente fascinante sobre as origens de tudo o que nos torna únicos e humanos."
Sobre a autor:
Jürgen Kaube é um reconhecido escritor na área da Ciência. Iniciou a sua carreira na Universidade de Bielefeld antes de se juntar à equipa editorial do Frankfurter Allgemeine Zeitung. Em 2012 foi reconhecido publicamente Science Writer of the Year pela medium magazine e em 2015 tornou-se um dos editores do Frankfurter Allgemeine Zeitung e recebeu o Ludwig Börne Prize.
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