Julho 2021
Ciência Na Frente
Do Infinitamente Pequeno ao Infinitamente Grande
Julho de 2021
O preço da imortalidade
Como é que o indivíduo pode escapar a um espaço e a um tempo que o envolve? Esta é a pergunta mais subversiva da cultura ocidental. Os sábios e os sistemas filosóficos deram algumas soluções - a prática da ascese, a contemplação mística, a especulação... - reenviando o espaço e o tempo para um mundo de ilusões e de contingências. As doutrinas religiosas recorreram a récitas justificando o exílio do humano como uma situação que lhe não é natural e a quem lhe é prometido ser arrancado dela para ser integrado na eternidade.
«Acabar com o finito», como dizia o filósofo Hegel; renovar a aliança com Deus, como diz a Bíblia: a humanidade parece não ter um destino mais essencial do que neutralizar o espaço e o tempo. Isto faz com que ela inveje os deuses e os animais, dos quais achamos que escapam ao sentimento de finitude? Por um lado, certamente. As ambições exibidas hoje em dia pelas tecnociências exprimem-no à sua maneira: colocar o progresso ao serviço da constituição de um mundo no qual a ubiquidade terá refutado a dispersão imposta pelo espaço - tal é o esperado benefício do ciberespaço, que configura a mundialização. Multiplicação dos encorajamentos para curar o envelhecimento e da própria morte, tal é a preocupação mais insistente dos transhumanistas.
Depois das filosofias e das religiões, são agora as ciências e as técnicas que carregam as bandeiras do combate contra as limitações impostas aos humanos pelo espaço e o tempo.. As virtudes da desmaterialização fazem aparecer, à sua maneira, a solidariedade da conceção tecnocientífica do mundo com a metafísica característica das filosofias e das religiões saídas do platonismo e do cristianismo. O indício mais claro desta solidariedade consiste na obsessão de acabar com a morte, agora já não com uma conversão espiritual, que, ao livrar-nos do corpo, abria-nos a porta ao absoluto e à eternidade, mas devido às inovações produzidas pela convergência das tecnologias.
O aumento das capacidades humanas anunciadas por esta convergência das nanociências, das biotecnologias, da informática e das ciências cognitivas - as NBIC - dependerá antes de mais pela desmaterialização e pela velocidade dos processos. Isto para dizer que ela se centrará na redução dos constrangimentos impostos, no espaço e no tempo, pela simultaneidade e pela sucessão. Estes dois parâmetros não resistirão aos avanços que já são visíveis com a conquista do espaço, com o computador quântico, com as prótese cérebro-máquina, com os implantes intracerebrais ou com a exploração das ondas eletromagnéticas. Em dúvida que a resistência dos corpos e a inércia cinética irão sucumbir. A desmaterialização ou a virtualização das realidades não provoca apenas a refutação dos quadros espácio-temporais, elas também dissolvem as fronteiras do ser: a hibridação do vivo e da eletrónica, que a biologia de síntese e as nanotecnologias já estão a experimentar, obriga a uma confusão entre os géneros e as espécies naturais, a um realinhamento dos humanos, dos animais e das máquinas, ao ponto de se designar o ciborgue, esse misto de cibernética e de organismo biológico, como o único horizonte para o Homo sapiens.
A realidade dos laboratórios ultrapassa a ficção-científica, ao alimentar o cenário da morte da morte, que simboliza, à sua maneira, o fantasma do afastamento da finitude: a imortalidade - ou a amortalidade, como dizem os mais prudentes - não é mais do que uma questão de transferência da memória para materiais inalteráveis ou para o ciberespaço, ou de fabricação de órgãos ou de substitutos de órgãos, ou de manipulação das células estaminais embrionárias, até à edição de genomas... As técnicas aí estão quase disponíveis, com recursos como a digitalização, as tesouras moleculares ou as biopróteses. Testadas no desejo imemorial da imortalidade, as proezas tecnológicas poderão ser travadas? Qual seria a utilidade de deplorar as simplificações infligidas ao humano, cuja vida seria reduzida ao funcionamento dos algoritmos e em que a morte seria afastada com o domínio desses metabolismos elementares ou mesmo com a virtualização dos seus esquemas cognitivos?
A imortalidade sem a morte: apenas os animais que sabemos como inconscientes perante a morte podem ilustrar esta situação, ao renascerem idênticos a eles próprios no seio da sua espécie. Os etólogos sabem que as coisas não são assim tão simples, mesmo se a ideia de uma morte-renascimento aflora ao espírito de certos transhumanistas, que não tem que ver com a consciência dos indivíduos destinados a serem "bionizados" ou "ciborgizados". A imortalidade com a morte: as tradições filosóficas e religiosas descrevem-na de muitas maneiras - com o culto dos heróis, a transmissão de palavras e obras excecionais, ações fora do comum e suscetíveis de reivindicar a redenção dos seus autores... Mas ter de morrer para se tornar eterno não convence aqueles que negligenciam a vida simbólica dos humanos. A imortalidade, à custa do esquecimento do corpo e da negação do tempo, tal é a pobre utopia que apenas podem gerar as tecnociências ao tentar perspetivar o pós-humano.
Fonte: La Recherche - julho/setembro 2021, n.º 566, p. 56
Jean-Michel Besnier
Filósofo, Universidade Sorbonne, Paris
(adaptado)
Estará um oceano preso na crosta terrestre marciana?
Marte já teve água suficiente para
encher um oceano global entre 100 a 1.500 metrosde profundidade. Mas os cientistas
têm tido problemas para explicar para onde foi toda essa água. Na revista
Science de 2 de abril, Eva Scheller e Bethany Ehlmann (ambas do Caltech) usaram
um modelo do ciclo da água marciano para mostrar que a maior parte dela estará aprisionada
na crosta marciana em minerais que absorvem água.
A água (H2O) raramente contém uma forma
mais pesada de hidrogénio chamada deutério, que possui um neutrão extra. A água
de Marte tornou-se mais pesada ao longo do tempo e estudos anteriores consideraram
que isso aconteceu porque a água evaporou-se para o espaço. Depois da luz
ultravioleta do Sol ter separado as moléculas de água, os habituais átomos de
hidrogénio tinham maior tendência para escaparem da atmosfera do que o mais
pesado deutério.
No entanto, esta fuga não explica toda a perda de água. Assim,
Scheller, Ehlmann e os seus colegas construíram um modelo que leva em
consideração a química de retenção de água na superfície, descobrindo que este
processo desempenha um papel significativo. “Mais de metade da água inicial de
Marte foi sequestrada na crosta há 3 mil milhões de anos atrás ”, disse
Scheller na 52ª Conferência de Ciência Lunar e Planetária em março. Liza
Wernicke e Bruce Jakosky (ambos da Universidade do Colorado, Boulder) usaram
dados independentes das sondas Mars Odyssey e Mars Express para medir a
quantidade de água presa em minerais hidratados. As suas estimativas,
publicadas na edição de março do Journal of Geophysical Research: Planets, são
consistentes com os resultados da equipe de Scheller. No entanto, Jakosky
adverte que ainda há muita coisa que não sabemos sobre a história deste
planeta. Esse desconhecimento traz problemas quanto à conexão entre a presença
atual de minerais hidratados e a evolução de longo prazo do ciclo da água. O
rover Perseverance da NASA será a chave para testar e construir o modelo do
ciclo da água de Marte, disse Ehlmann. As rochas dentro e ao redor da Cratera
de Jezero são as mais antigas a serem exploradas por um rover, e testes de
laboratório de eventuais amostras que sejam envaidas para a Terra podem fazer a
diferença entre cenários de evolução.
Fonte: Sky&Telescope - julho 2021, Vol. 1n.º 141, p. 9
Monica Young,
(adaptado)
O que posso observar no céu de julho?
5 - Lua no apogeu a 405 341 Km da Terra - 15:47
5 - Terra no afélio a 152,1 milhões de quilómetros do Sol - 23:00
8 - La a 4ºN de Mercúrio - 06:00
21 - Lua no perigeu a 364 521 Km da Terra - 11:24
24 - Chuva de meteoros da Alfa Capricornídeos - 00:00
24 -Lua a 4ºS de Saturno - 18:00
26 - Lua a 4ºS de Júpiter - 02:00
Céu visível às 00:00 horas do dia 1 de julho em Lisboa mostrando os planetas Júpiter e Saturno. |
Céu visível às 05:20 horas do dia 15 de julho em Lisboa mostrando os planetas Mercúrio, Júpiter e Saturno. |
Fases da Lua em julho
10 - às 01h 17min - nova
17 - às 10h 11min - crescente
17 - às 10h 11min - crescente
24 - às 02h 37min - cheia
01 - às 21h 11min - minguante
31 - às 13h 16min - minguante
Planetas visíveis a olho nu em julho
MERCÚRIO - Será visível, de manhã, por volta do instante do início do crepúsculo civil, até 25 de julho.
VÉNUS - Durante o mês de julho surge como estrela da tarde.
MARTE - Pode ser visto em meados de julho na constelação de Leão.
JÚPITER - Pode ser visto durante a maior parte da noite.
VÉNUS - Durante o mês de julho surge como estrela da tarde.
MARTE - Pode ser visto em meados de julho na constelação de Leão.
JÚPITER - Pode ser visto durante a maior parte da noite.
Fonte: Observatório Astronómico de Lisboa
(para localizações aproximadas de 41.1756ºN, 8.5493ºW)
Data | Magnitude | Início | Ponto mais alto | Fim | Tipo da passagem | ||||||
(mag) | Hora | Alt. | Az. | Hora | Alt. | Az. | Hora | Alt. | Az. | ||
1-7 | -2,0 | 03:18:25 | 25° | ESE | 03:18:25 | 25° | ESE | 03:20:23 | 10° | ENE | visível |
1-7 | -2,5 | 04:51:23 | 12° | O | 04:54:09 | 36° | NNO | 04:57:20 | 10° | NE | visível |
2-7 | -3,3 | 04:05:48 | 35° | O | 04:06:53 | 54° | NNO | 04:10:12 | 10° | NE | visível |
3-7 | -3,4 | 03:20:10 | 62° | NE | 03:20:10 | 62° | NE | 03:23:02 | 10° | NE | visível |
3-7 | -1,5 | 04:54:16 | 10° | ONO | 04:56:52 | 20° | NNO | 04:59:28 | 10° | NNE | visível |
4-7 | -1,5 | 02:34:29 | 21° | ENE | 02:34:29 | 21° | ENE | 02:35:47 | 10° | ENE | visível |
4-7 | -1,8 | 04:07:26 | 15° | ONO | 04:09:28 | 26° | NNO | 04:12:21 | 10° | NE | visível |
5-7 | -2,5 | 03:21:43 | 34° | NO | 03:22:08 | 35° | NNO | 03:25:16 | 10° | NE | visível |
5-7 | -0,9 | 04:57:40 | 10° | NO | 04:59:41 | 15° | N | 05:01:43 | 10° | NNE | visível |
6-7 | -2,1 | 02:35:57 | 34° | NNE | 02:35:57 | 34° | NNE | 02:38:09 | 10° | NE | visível |
6-7 | -1,0 | 04:09:57 | 10° | NO | 04:12:13 | 17° | NNO | 04:14:30 | 10° | NNE | visível |
7-7 | -1,1 | 01:50:08 | 16° | NE | 01:50:08 | 16° | NE | 01:50:58 | 10° | NE | visível |
7-7 | -1,3 | 03:23:04 | 14° | NO | 03:24:47 | 20° | NNO | 03:27:23 | 10° | NNE | visível |
7-7 | -0,8 | 05:00:42 | 10° | NNO | 05:02:35 | 14° | N | 05:04:28 | 10° | NE | visível |
8-7 | -1,7 | 02:37:11 | 25° | NNO | 02:37:23 | 25° | NNO | 02:40:16 | 10° | NE | visível |
8-7 | -0,7 | 04:13:13 | 10° | NO | 04:15:05 | 14° | N | 04:16:58 | 10° | NNE | visível |
9-7 | -1,5 | 01:51:13 | 26° | NNE | 01:51:13 | 26° | NNE | 01:53:09 | 10° | NE | visível |
9-7 | -0,7 | 03:25:35 | 10° | NO | 03:27:36 | 15° | N | 03:29:37 | 10° | NNE | visível |
9-7 | -0,8 | 05:03:07 | 10° | NNO | 05:05:26 | 17° | NNE | 05:07:46 | 10° | ENE | visível |
10-7 | -1,1 | 01:05:08 | 17° | NE | 01:05:08 | 17° | NE | 01:06:01 | 10° | NE | visível |
10-7 | -0,8 | 02:38:03 | 11° | NO | 02:40:07 | 17° | NNO | 02:42:23 | 10° | NNE | visível |
10-7 | -0,7 | 04:15:54 | 10° | NNO | 04:17:58 | 15° | N | 04:20:01 | 10° | NE | visível |
Como usar esta grelha:
Coluna Data - data da passagem da Estação;
Coluna Brilho/Luminosidade (magnitude) - Luminosidade da Estação (quanto mais negativo for o número maior é o brilho);
Coluna Hora - hora de início, do ponto mais alto e do fim da passagem;
Coluna Altitude - altitude medida em graus tendo o horizonte como ponto de partida 0º;
Coluna Azimute - a direção da Estação tendo o Norte geográfico como ponto de partida.
Coluna Azimute - a direção da Estação tendo o Norte geográfico como ponto de partida.
Fonte: http://www.heavens-above.com/
Vídeo do Mês
Vamos fazer um upgrade do sistema operativo humano
(Quando necessário, para ativar as legendas automáticas proceder do seguinte modo: no canto inferior direito clicar no símbolo "roda dentada"; abrem-se as Definições; clicar aí e escolher Legendas; depois clicar em Traduzir Automaticamente; finalmente escolher Português na lista.)
(Quando necessário, para ativar as legendas automáticas proceder do seguinte modo: no canto inferior direito clicar no símbolo "roda dentada"; abrem-se as Definições; clicar aí e escolher Legendas; depois clicar em Traduzir Automaticamente; finalmente escolher Português na lista.)
Imagem do Mês
Poucas observações cósmicas são tão emocionantes como a
Nebulosa de Órion. Também conhecida como M42, o gás brilhante da nebulosa
envolve estrelas jovens e quentes à beira de uma imensa nuvem molecular
interestelar a apenas 1.500 anos-luz de distância. A Nebulosa de Órion oferece
uma das melhores oportunidades para estudar como as estrelas nascem em parte,
porque é a região de formação de estrelas em grande escala mais próxima, mas
também porque as estrelas energéticas da nebulosa explodiram em nuvens de gás e
poeira que de outra forma bloqueariam a nossa visão - fornecendo um olhar
íntimo para uma série de estágios contínuos de nascimento e evolução estelar. A
imagem em destaque da Nebulosa de Órion está entre as mais nítidas de todos os
tempos, construída usando dados do Telescópio Espacial Hubble. A totalidade da
Nebulosa de Órion abrange cerca de 40 anos-luz e está localizada no mesmo braço
espiral da nossa Galáxia, tal como o Sol.Fonte: www.nasa.gov
Livro do Mês
A partir deste ano vamos iniciar uma nova secção, a do livro do mês. Aqui serão apresentados livros, preferencialmente, de ensaios científicos, sociais, filosóficos, esperando que motivem os nossos "bloggers" a descobri-los.
Sinopse
Se o cérebro artificial ultrapassar algum dia o cérebro humano em inteligência geral, o futuro da nossa espécie vai depender das ações da poderosa inteligência artificial (IA).
Neste livro, ambicioso e original, Nick Bostrom examina o que considera ser o problema essencial do nosso tempo: seremos capazes de manter sob controlo as investigações e os avanços da IA antes que seja tarde de mais?.
Sobre o autor:
Nick Bostrom, nascido a 10 de Março de 1973 na Suécia, é um filósofo da Universidade de Oxford reconhecido pelo seu trabalho sobre o impacto da tecnologia futura nas sociedades.
Em 2011 fundou o Oxford Martin Programme on the Impacts of Future Technology. Criou também o Future of Humanity Institute, na Universidade de Oxford.
É autor de mais de duzentos artigos.
Em 2009 e 2015 foi considerado um dos principais pensadores do mundo pela Foreign Policy.
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