Fevereiro 2023

 

                                     
                                                                         
                                                                              



Ciência Na Frente

Do Infinitamente Pequeno ao Infinitamente Grande

Fevereiro de 2023














Um mundo depois do cromossoma Y?


Os cromossomas sexuais humanos, o X (à esquerda) e o Y (à direita). Este último é muito mais pequeno e tem muito menos genes do que os outros cromossomas.


     A análise genética de uma espécie de roedor mostra que os mamíferos poderiam sobreviver à extinção do seu cromossoma Y, responsável pela diferenciação sexual do macho.

     Na maioria dos mamíferos modernos, o sexo biológico é determinado pelos cromossomas sexuais herdados de ambos os pais – um X da mãe, e um X ou Y do pai. Mais especificamente, é a presença ou ausência do cromossoma Y que determina se um indivíduo será do sexo masculino ou feminino. No entanto, este último, em plena degeneração no genoma humano, poderá desaparecer nalguns milhões de anos. Será que isto poderá levar ao desaparecimento de nossa espécie? Não há nenhuma certeza, porque a vida encontra sempre uma forma - às vezes surpreendente! – de se subsistir. O seu instrumento? A evolução. Uma equipa de biólogos, liderada por Asato Kuroiwa, da Universidade de Hokkaido, no Japão, acaba de ilustrá-lo, revelando como duas espécies de roedores, que já perderam o cromossoma Y, sobreviveram a esse evento mantendo uma diferenciação sexual.
     O cromossoma Y desempenha um papel fundamental neste processo porque alberga um gene arquiteto, SRY, responsável pela síntese de testosterona e, por extensão, do desenvolvimento dos testículos. Este cromossoma contém muito pouco genes – apenas cerca de cinquenta – contra quase os novecentos do cromossoma X, que são responsáveis ​​por uma ampla gama de funções dentro do nosso organismo. Portanto, este cromossoma Y não é fundamentalmente essencial à vida da nossa espécie – as mulheres funcionam muito bem sem ele – mas, na sua ausência, a capacidade para os seres humanos se reproduzirem e fazer a sua espécie prosperar, seriam reduzidos a nada. No entanto, este cromossoma é hoje muito pequeno, atrofiado, quando se calcula que tivesse o mesmo tamanho do seu homólogo X, há cerca de 160 milhões de anos, nos primeiros mamíferos. Se continuar a degenerar-se ao mesmo ritmo, o que tudo parece indicar, poderá desaparecer para sempre daqui a 4,6 milhões de anos. Essa degenerescência tem origem no facto de que o cromossoma Y, ao contrário de todos os outros, existe apenas um em cada indivíduo que o possui, transmitido de pai para filho. Isto significa que não pode estar submetido ao fenómeno de recombinação genética, um mecanismo natural de mistura que ocorre em, e entre, os cromossomas homólogos em cada geração e que limita a acumulação de mutações e a consequente perda da função dos genes. Sem essa vantagem, os genes do cromossoma Y degeneram até serem completamente perdidos. 

O roedor Tokudaia osimensis perdeu o seu cromossoma Y e o gene SRY, que está implicado na diferenciação sexual. Outro mecanismo continua a assegurar uma diferença marcada entre os machos e as fêmeas.

     A esperança permanece, no entanto, como demonstraram os biólogos da Universidade de Hokkaido. Eles interessaram-se por dois grupos de roedores, em particular pela espécie Tokudaia osimensis, endémica de certas ilhas japonesas, no arquipélago de Amami. Na década de 1990, os investigadores descobriram que todos os indivíduos, machos e fêmeas, possuíam, cada um, apenas uma cópia do cromossoma X. O cromossoma Y e sua região SRY desapareceram (machos e fêmeas são, assim, ambos XO). Há três décadas, que os biólogos perseguem, sem sucesso, o mecanismo que permite a diferenciação sexual nesses murídeos.

Nos machos da espécie Tokudaia osimensis, no cromossoma 3, a duplicação da região Enh 14 contribui para aumentar a expressão do gene Sox9, que conduz ao desenvolvimento dos testículos. Este mecanismo substitui aquele que era assegurado pelo gene SRY, localizado no cromossoma Y e que desapareceu neste roedor.  

     A equipa de Asato Kuroiwa analisou minuciosamente o genoma desses roedores em busca de regiões genéticas que diferem entre machos e fêmeas. Notaram que a maioria dos genes do cromossoma Y (não ligados à diferenciação sexual) tinham-se deslocado para outros cromossomas, com exceção do SRY, cujo vestígio não foi encontrado. No entanto, uma diferença significativa foi observada entre machos e fêmeas no cromossoma 3, um autossoma, ou seja, um cromossoma normalmente não sexual. Mais especificamente, tratava-se da duplicação de uma região, chamada Enh14, composta por 17 000 pares de bases – as unidades constituintes da molécula de ADN. Esta duplicação está localizada no
mesmo cromossoma e suficientemente perto de um gene conhecido por desempenhar um papel no desenvolvimento dos órgãos genitais masculinos, o gene Sox9. Nos mamíferos que possuem um cromossoma Y, o gene SRY produz uma proteína (SRY) que atua como um fator de transcrição para o gene Sox9: ele liga-se a uma sequência regulatória específica próxima do gene Sox9 e, graças a essa proximidade, aumenta a expressão desse gene nas gônadas indiferenciadas, o que desencadeia a sua diferenciação. 
     Os biólogos estimam que a área Enh14 duplicada, alvo de um fator de transcrição ainda a ser determinado, desempenharia o papel da proteína SRY, o que parece confirmar as suas experiências. Com efeito, introduzido nos ratos, esta região duplicada aumenta a atividade do Sox9, o que indicaria que permite que esse gene funcione sem a intervenção do gene SRY ausente. Para Asato Kuroiwa e para os seus colegas, o cromossoma 3 torna-se assim um cromossoma sexual, sendo os machos os únicos portadores da versão com a região Enh14 duplicada. Os investigadores já conseguiram descrever as mudanças em comparação com o cromossoma 3 ancestral. 
     Pode ser, portanto, que, daqui a alguns milhões de anos, o caminho seguido por Tokudaia osimensis seja encontrado noutros mamíferos. E se ainda existirem machos humanos nesse futuro distante, seria talvez graças a uma transferência das funções de diferenciação sexual num novo cromossoma.

Fonte: Pour la Science - fevereiro 2023, n.º 544, p. 6-7

William Rowe-Pirra 
(adaptado)


Como o frio favorece o resfriado




     O ar frio aumenta o risco de infeção viral, porque uma pequena descida da temperatura do nariz faz perder metade da nossa imunidade.

      Se as temperaturas baixas favorecem os resfriados e outras infeções respiratórias, é porque elas neutralizam, dentro do nariz, as vesículas extracelulares especializadas em parar os vírus. É isto que demonstra uma equipa da escola de medicina de Harvard (E.U.A.), que dizem fazer assim «a primeira explicação plausível quantitativamente e biologicamente» do aumento da infeciosidade viral no inverno. Os investigadores efetivamente conseguiram medir in vitro o número e o efeito dessas pequenas vesículas, ao imitarem tentativas de infeção nas células da mucosa nasal. Todas as vezes, um enxame de vesículas extracelulares foi libertado pelas células para se ligarem às partículas virais, impedindo-as de infetar as células.
     Os investigadores detetaram que a temperatura dentro do nariz caía cerca de 5ºC, quando o ar exterior passava de 23ºC para 4ºC, sendo as células das mucosas testadas com 37ºC e com 32ºC. O resultado: quando faz frio, a produção de vesículas cai 42%. «O ar frio está associado a um risco acrescido de infeção viral, já que uma pequena descida da temperatura dentro do nariz, faz perder cerca de metade da nossa imunidade», resume o Dr. Benjamin Bleier e que dirigiu as investigações.
     Este estudo reconcilia assim em parte o empirismo popular, que recomenda «que nos agasalhemos para não apanharmos frio», e a microbiologia, que sabe que uma infeção é sempre causada por um agente infecioso e não pelo frio. Assim, o cachecol e o gorro não são a solução para conservarem quentes as células do nariz. Para manter a imunidade nasal, estes investigadores sugerem antes... a máscara! «As máscaras não só protegem a inalação direta dos vírus, mas funcionam como tivéssemos uma camisola sobre o nariz», diz-nos Benjamin Bleier.            

Fonte: Sciences et Avenir - La Recherche - fevereiro 2023, n.º 912, p. 18

H. J.
(adaptado)

O que posso observar no céu de fevereiro?



4 -  Lua no apogeu a 406.477 km da Terra - 08:55
5 - Marte a 8ºN de Aldebarã - 07:00
18 - Lua a 4ºS de Mercúrio - 21:00
19 - Lua no perigeu a 358 267 Km da Terra - 09:06
22 - Lua a 2ºS de Vénus - 08:00
22 - Lua a 1,2ºS de Júpiter - 22:00
28 - Lua a 1,1ºN de Marte - 05:00
 





Fases da Lua em fevereiro


           

                20 - às 07h 06 min - nova

                27 - às 08h 06min - crescente

                05 - às 18h 29min - cheia

                13 - às 16h 01min - minguante
                
                









Planetas visíveis a olho nu em fevereiro


MERCÚRIO  Pode ser visto de manhã. Atingiu o maior alongamento – sua maior distância aparente do Sol – em 30 de janeiro. Está bem posicionado durante todo o mês de fevereiro – na direção do nascer do sol – para visualizações a partir do Hemisfério Sul. Mas para os observadores do Hemisfério Norte vai ser muito mais difícil de detectar no crepúsculo da manhã. Mercúrio deixará de ser visível em meados do mês de fevereiro.

VÉNUS - Pode ser visto de noite. O planeta mais brilhante, está a subir cada vez mais alto a oeste após o pôr-do-sol. 

MARTE - Pode ser visto de noite. Está no alto do céu noturno, visivelmente de cor vermelha, podendo ser observado várias horas depois da meia-noite. Marte ainda é mais brilhante do que a maioria das estrelas, embora esteja encolhendo e desaparecendo desde sua recente oposição em 8 de dezembro de 2022.

JÚPITER pode ser visto ao anoitecer na constelação de Aquário durante o mês de fevereiro.

SATURNO Está muito perto do sol para ser visível este mês. Sua conjunção com o sol acontecerá em 16 de fevereiro.

 
Fonte: Observatório Astronómico de Lisboa 




(para localizações aproximadas de 41.1756ºN, 8.5493ºW)
    
DataMagnitudeInícioPonto mais altoFimTipo da passagem
(mag)HoraAlt.Az.HoraAlt.Az.HoraAlt.Az.
17-2-1,606:11:5110°SSO06:14:3925°SE06:17:2810°ENEvisível
18-2-1,005:24:4511°SSE05:26:1815°SE05:28:1510°Evisível
19-2-3,706:11:4818°SO06:14:0575°SE06:17:2510°ENEvisível
20-2-2,705:25:3940°SE05:25:3940°SE05:28:4110°ENEvisível
21-2-0,404:39:1712°E04:39:1712°E04:39:4110°Evisível
21-2-3,206:12:1127°O06:13:3342°NNO06:16:4510°NEvisível
22-2-2,905:25:3944°NE05:25:3944°NE05:28:0710°NEvisível
23-2-0,404:38:5813°ENE04:38:5813°ENE04:39:2010°ENEvisível
23-2-2,206:11:5119°NO06:13:0023°NNO06:15:4410°NEvisível
24-2-2,105:25:0325°N05:25:0325°N05:27:0410°NEvisível
      
 
    

Como usar esta grelha:

Coluna Data - data da passagem da Estação;
Coluna Brilho/Luminosidade (magnitude) - Luminosidade da Estação (quanto mais negativo for o número maior é o brilho);
Coluna Hora - hora de início, do ponto mais alto e do fim da passagem;
Coluna Altitude - altitude medida em graus tendo o horizonte como ponto de partida 0º;
Coluna Azimute - a direção da Estação tendo o Norte geográfico como ponto de partida.

Fonte: http://www.heavens-above.com/



Vídeo do Mês



A inativação do cromossoma X e a epigenética

(Quando necessário, para ativar as legendas automáticas proceder do seguinte modo: no canto inferior direito clicar no símbolo "roda dentada"; abrem-se as Definições; clicar aí e escolher Legendas; depois clicar em Traduzir Automaticamente; finalmente escolher Português na lista.)


Imagem do Mês




Aglomerado globular de estrelas NGC 6355 do Hubble

      No passado, aglomerados globulares mandaram na Via Láctea. De volta a esses velhos tempos, quando a nossa galáxia se formou, é possível que milhares de aglomerados globulares vagueassem pela nossa Galáxia. Atualmente, restam menos de 200. Ao longo das eras, muitos aglomerados globulares foram destruídos por repetidos encontros fatídicos uns com os outros ou com o centro galáctico. As relíquias sobreviventes são mais antigas do que qualquer fóssil da Terra, mais antigas do que qualquer outra estrutura na nossa Galáxia e limitam a própria idade absoluta do nosso universo. Se houver algum, existem poucos aglomerados globulares jovens deixados na nossa Via Láctea, porque as condições atuais não são adequadas para que mais se formem. Esta imagem mostra uma visão do Telescópio Espacial Hubble da NGC 6355, com 13 mil milhões de anos, um aglomerado globular sobrevivente e atualmente a passar perto do centro da Via Láctea. As estrelas do enxame globular estão concentradas na direção do centro da imagem e destacam-se pelas estrelas azuis brilhantes. A maioria das outras estrelas desta imagem são mais escuras, mais vermelhas e, apenas por coincidência, se encontram perto da direção do NGC 6355.
Fonte: www.nasa.gov



Livro do Mês




Sinopse

    Depois de nos apresentar os conceitos fundamentais de espaço, tempo, energia e matéria, descreve-nos os três pilares da física moderna - teoria quântica, relatividade e termodinâmica -, cuja unificação nos dará finalmente uma compreensão plena da realidade. Utilizando maravilhosos exemplos e analogias, desmistifica a física das escalas extremas - cósmica e quântica -, as fronteiras especulativas da disciplina e a física que sustenta as nossas experiências e tecnologias quotidianas. Após a leitura deste livro, a física irá surgir-nos com um novo rosto: uma intrépida demanda humana dos princípios fundamentais que governam o mundo que nos rodeia, orientada pelos valores nucleares da honestidade e da dúvida.

Sobre o autor:



     Jim Al-Khalili, nascido em 1962 em Bagdade e naturalizado britânico, é professor de Física na Universidade de Surrey e membro da Royal Society. É um dos comunicadores de ciência mais populares do Reino Unido, tendo escrito numerosos livros, entre os quais Quantum: A Guide for the Perplexed; The House of Wisdom: How Arabic Science Saved Ancient Knowledge and Gave Us the Renaissance; e Life on the Edge: The Coming of Age of Quantum Biology.

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